sexta-feira, 9 de março de 2012





“Para ser grande, sê inteiro. Nada teu exagera ou exclui. Sê todo em cada coisa. Põe quanto és no mínimo que fazes. Assim em cada lago a lua toda brilha porque alta vive”. Fernando Pessoa

Toda e qualquer expressão escrita pode ser interpretada de diversas maneiras, desde que façamos a abstração de seu significado concreto comum.

A pessoa que está voltada para o lado exterior da vida encontrará uma justificativa para seu comportamento nas palavras de Fernando Pessoa. 

Mas quem tenta aprofundar-se nos valores interiores também ouve aí a ressonância sutil de uma aspiração insatisfeita: a vibração de uma corda sensível que responde à busca daquilo que o ser humano pode atingir de mais elevado...

Ora, quem não é chamado a se desviar do lado superficial das coisas e a olhar para o interior de si mesmo?

Quem não é chamado a se render a este convite, que ressoa no coração desde sua juventude? 

Quem não é chamado para cumprir sua vocação eterna?

À medida que alguém ouve esta voz e reage a ela, acaba compreendendo que
somente atingirá o objetivo supremo se todos os seus atos traduzirem sua aspiração, com o auxílio dos poderes gnósticos que a luz eterna faz nascer dentro dele. 

Se ele vive assim, certamente não é o tipo do conformista plácido que segue os princípios estabelecidos e as autoridades bem colocadas!

“Para ser grande, sê inteiro”

Quem quer ser grande, deve entregar-se por inteiro. 

Seu desejo secular deve falar do fundo de seu ser, muito fortemente, com convicção, sem fraqueza, sem hesitação. 

Seu grande destino exige dele completa rendição de sua mente, de seus sentimentos, de sua vontade, de suas ações. 

Não se pede que ele exerça a bondade humana, mas sim que ofereça sua alma a fim de que ela renasça.Talvez isto pareça um paradoxo.

Mas, se alguém quer captar a eternidade com seus sentidos terrestres, as oposições vão-se tornando cada vez maiores. 

Por isso, é preciso aprender a deixar de lado o que chamamos de “realidade” na existência terrestre, para sintonizar a realidade da vida eterna. 

Ora, estas duas realidades são absolutamente contrárias.

Não há nenhum sentido em estudar e analisar o Conhecimento para adquirir conhecimentos enciclopédicos.

Tanto a posse quanto o dogmatismo significam estagnação e esclerose dos
valores interiores. 

Se alguém renuncia às posses exteriores ou interiores, sentirá que a Gnosis nada tem a ver com a compreensão intelectual. 

A força regeneradora que aflui da fonte original da verdadeira Vida não se dirige ao “eu”.

Quem busca a eternidade se esforça, portanto, para compreender a voz da
eternidade, e se volta para o princípio central de sua alma, oculto dentro de seu
coração, pois é por intermédio do coração que o chamado pode atingi-lo: o
coração é o princípio intermediário que permite. 

No decorrer de um processo de maturação interior, de repente há o reconhecimento. Assim, aquele que busca experimenta conscientemente
a Luz que o está chamando.

“Nada teu exagera ou exclui”

Não renegues, nem aviltes o que te pertence. A humanidade sempre foi guiada
pelos mensageiros da Luz no decorrer de seu desenvolvimento terrestre. 

Eles sempre adaptaram esta doutrina às circunstâncias mutantes da vida, a fim de manter aberto o caminho de retorno para todos os que buscam a verdade.

Quem busca a verdade possui um tesouro precioso oculto no mais profundo de seu ser, mas geralmente a sabedoria assim revelada é renegada e aviltada por falta de compreensão ou de fé, por preguiça, ou ainda por medo das conseqüências. 

Uma desculpa bem conhecida consiste em declarar que ainda se tem muitas coisas para fazer. 

É assim que as preocupações do dia-a-dia gastam a energia recebida para atingir o verdadeiro objetivo da vida.

O sábio chinês Lao-Tsé procurava sacudir seus contemporâneos, dizendo-lhes:

“Guardai distância das coisas e não vos contenteis com a aparência”.

“Sê todo em cada coisa”

Distanciar-se das coisas e no entanto “ser todo em cada coisa”? Seria isto um
novo paradoxo? Quem ouve o chamado interior tem de adaptar seus princípios,
se quiser segui-lo.

Deve seguir novos critérios com relação à intensidade de seu desejo e à vontade de satisfazê-lo.

Deixando de lado a multiplicidade das coisas da natureza, passa a dirigir sua aspiração ao chamado, a ele adapta seus pensamentos, e seus atos demonstram uma reviravolta total em sua vida. 

O equilíbrio assim adquirido lhe dá paz interior e o torna apto a agir de acordo com o que seu estado de ser humano sabe e pode fazer de melhor, tanto nas menores como nas maiores coisas. 

E isso, não por prudência, ou com sentimentos de superioridade, mas por que reconheceu, com toda modéstia, o seu lugar no plano de criação.

Uma grande tarefa o aguarda. Seu coração purificado vai-se voltando cada vez
mais para as correntes gnósticas da renovação e, neste processo, ele se mantém como uma pequena ilha de calma e de paz em meio ao mundo das
forças contrárias.

“Põe quanto és no mínimo que fazes”

“O comportamento correto é como a água: a água está em toda a parte e fica em todos os lugares. Ela também está nos lugares desprezados pelos homens.”, diz Lao-Tsé. E ele prossegue: “Aí está por que o sábio se aproxima de Tao. Ele ocupa o seu lugar exato. Seu coração é profundo como um abismo. Seu amor é perfeito. Ele se mantém na verdade, ele cumpre a verdade. Chamado a governar, ele mantém a ordem. Ele age bem. Ele passa à ação no momento exato. Como ele não discute, nada se pode reprovar nele.”

É impossível não compreender a clareza destas palavras. Quem segue o caminho espiritual evita qualquer compromisso entre a antiga consciência, que tenta manter-se, e a nova consciência do homem-alma que vai surgindo.

Ele coloca um guardião junto a seus pensamentos, pois o egocentrismo começa
com os pensamentos!

“Assim em cada lago a lua toda brilha, porque alta vive”

Aí está uma bela imagem! No silêncio da noite, longe do burburinho da vida
tumultuada de todos os dias, a água do lago se estende, límpida, calma, igual,
como um espelho perfeito que reflete a luz sem alterá-la. 

E a lua, esta não tem nem a vontade nem o poder de ser o sol. Sem a luz do sol, ela é um satélite da terra, um satélite sem vida. Mas, refletindo a luz do sol, ela a espalha de modo infinitamente suave e beneficente: ela a recebe e ao mesmo tempo a difunde, em benefício da vida.

Ela transforma o ouro do sol (símbolo do Espírito crístico universal) em luar cor de prata, brilho de alma, suave luz que quer conduzir os microcosmos decaídos a sua pátria original, assim como a humanidade inteira que vive sobre a terra, em vida ímpia.

É por isso que, se ouvirdes o chamado interior, não o renegueis, nem o avilteis!

Permanecei sempre, com integridade, em vosso trabalho. 

Coloca vossa nova alma nos mínimos atos!

Como a lua, que cumpre sua missão e se reflete no lago de vossa alma, assim sois chamados para vos tornar uma pedra de construção da Manifestação Universal, entregando-vos alegre e decididamente.

Grandes em vossa aspiração, sereis grandes em vossa realização

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