quarta-feira, 29 de fevereiro de 2012

O Senhor dos Anéis- Comentários e mensagens no filme






"Cabe a cada um decidir o que fazer com o tempo que lhe é concedido.."

Quando Frodo, o hobbit, chega nas profundezas da montanha de Moria, ele é invadido pela dúvida: 

"Eu desejaria nunca ter recebido o anel, desejaria que nada disso tivesse me acontecido". 

Gandalf, o mago, lhe responde: 

"Sempre pensamos assim no momento das provas, mas não temos o poder de decidir. Cabe a cada um decidir o que fazer com o tempo que lhe é concedido!"

O livro do século XX torna-se o acontecimento cinematográfico do século XXI. Assim foi anunciado o lançamento do filme da primeira parte da trilogia – A Sociedade do Anel. Durante o ano de 2002 ele vem sendo projetado nos cinemas do mundo inteiro.

Os livros de Tolkien já contam com cinqüenta milhões de leitores.
No Ocidente, A Sociedade do Anel ocupa o segundo lugar na lista dos bestsellers.
O primeiro lugar pertence ainda e sempre à Bíblia. O que apaixona tanto as pessoas nesse conto maravilhoso? Será a magistral adaptação, que custou 190 milhões de dólares? 

Ou então o mistério e a magia do conteúdo que se dirige a todos? A Sociedade do Anel se reporta ao combate entre a luz e as trevas, que ocorre no fim de uma era. 

Na Terra Média vivem grupos diferentes de seres, bons e maus. O poder de cada
grupo é ligado a um anel forjado em tempo longínquo com o único fim de dar um sentido histórico à evolução desses seres:

Três Anéis para os Reis-Elfos sob este céu,
Sete para os Senhores-Anões em seus rochosos corredores,
Nove para Homens Mortais, fadados ao eterno sono.
Os elfos são seres imortais de alta estatura que devem proteger os mortais da Terra Média, na qual muito do antigo conhecimento se perdeu. 

Mas os poderosos magos que acompanham os elfos dispõem desse conhecimento.
Os homens e os hobbits pertencem aos mortais da Terra Média. 
Estes últimos são de baixa estatura, não medem mais que um metro e se parecem muito com os homens.

Além dos dezenove anéis já citados, existe um vigésimo que não provém da luz, mas das trevas:

Um para o Senhor do Escuro em seu escuro trono.
Na Terra de Mordor onde as Sombras se deitam.
Um Anel para todos governar,
Um Anel para encontrá-los,
Um Anel para a todos trazer e na escuridão aprisioná-los
Na Terra de Mordor onde as Sombras se deitam.

A sorte dos habitantes da Terra Média teria sido selada há muito tempo se Sauron, o Senhor do Escuro, não tivesse sido vencido pela luz, alguns milhares de anos antes. Nessa derrota ele perdeu seu poder, e perdeu o anel.

Este permaneceu durante muito tempo oculto, inativo. 
Finalmente ele reapareceu entre os hobbits. Mas, agora que a vida na Terra Média aproximase do fim de um período de desenvolvimento, Sauron quer reunir novamente suas forças. 

Ele se torna cada dia mais poderoso, o que reaviva ao mesmo tempo o poder do anel. Sauron conseguiu conquistar os nove anéis dos homens. Os portadores desses anéis eram poderosos monarcas que agora foram reduzidos à condição
de escravos quase subumanos, submetidos a Sauron. Fantasmas em seu reino
de sombras. 

Sauron também rompeu o poder dos sete senhores anões e tomou posse de seus anéis. Somente os três anéis dos elfos ainda estão fora de seu alcance.

O Senhor do Escuro também tem em suas fileiras um grande número de elfos que degeneraram até tornarem-se orcs monstruosos, soldados a soldo de Sauron. 

Para retomar toda a sua força e seu poder, Sauron deve se apossar do último anel; por isso ele fica totalmente concentrado nessa finalidade.

Por força das circunstâncias, Frodo, um hobbit, encontra-se de posse do anel tão avidamente cobiçado. Os poderes das trevas o perseguem assim que ele inicia, com seus oito companheiros, a perigosa viagem pelas ravinas da Montanha da Perdição, no país de Mordor. Lá, ele deve jogar o anel no fogo de onde proveio, pois é o único meio de aniquilar para sempre o poder das Trevas.

Uma compilação de acontecimentos seculares, apoiando-se num grande conhecimento de mitos e lendas, o autor J.R.R. Tolkien escreveu uma história
cheia de símbolos eloqüentes, e o diretor Peter Jackson foi inspirado para
transmiti-los em níveis profundos por trás dos maravilhosos acontecimentos
do filme, das escaladas, batalhas e monstros. 

Talvez seja esse o motivo por que tanta gente se apaixonou e por que essa compilação de acontecimentos seculares comoveu tantos leitores e espectadores. 

É como se eles olhassem para trás, para uma época na qual tomaram parte, inconscientemente; como se lhes mostrassem alguma coisa que se relacionasse com seu passado microcósmico, ainda presente neles como uma imagem adormecida.

O espectador entra na sala do cinema. Após a publicidade e os trailers, ele mergulha, durante três horas, na história da Terra Média. Como os atores, ele entra na pele dos personagens, e assim vivencia como que uma parte de seu próprio passado. 

Ele sofre e luta, com Frodo e seus amigos, no caminho que conduz ao turbilhão da
Montanha da Perdição, no sombriopaís de Mordor, para auxiliá-los a destruir
o anel do mal.

Entre os nove companheiros chamados para realizar com êxito essa tarefa há um elfo, um mago, um anão, dois homens e quatro hobbits. 

Cada qual exerce um papel importante nessa pequena comitiva, mas três dentre eles têm uma missão excepcional: o mago Gandalf, o homem Aragorn e o hobbit
Frodo, portador do anel. 

Gandalf é imortal como os elfos, superior aos homens. Mas, no momento, sua sorte
está estreitamente ligada à dos mortais, sem que sua sabedoria e sua magia sejam submissas às limitações da vida sobre a Terra Média. 

Por esse motivo, ele pode combater o mal que se manifesta de forma visível ou invisível. No início, Tolkien denomina o mago de "Gandalf, o cinzento". 

Ele deve suportar uma série de provas para tornar-se "Gandalf, o branco". 

Sua nova condição lhe permitirá deixar, com os elfos, a Terra Média, quando esse campo de evolução chegar à expiração. 

Gandalf terá, então, realizado sua missão.

Esses seres existiram?

No espectador desperta uma certa suspeita de que se trata aqui de uma realidade ainda invisível. 

O homem mortal deste século perdeu-se na matéria e a sabedoria secular concernente a todas as ondas de vida que acompanham a humanidade lhe é quase desconhecida.

Ela lhe transmite, no máximo, fragmentos confusos, mas ele não conhece o final da história. Esses seres viveram realmente? Existem ainda hoje, e trabalham ainda com a Luz, com a finalidade de retirar a humanidade de seu caminho de morte?

A princípio, não se conhece a origem de Aragorn. Os homens e os hobbits o denominaram Passolargo, o vagabundo. 

Mas, no grupo que deve resolver o mistério do anel, descobre-se, aos poucos, que ele foi rei. Ele descende dos reis da Terra Média que, outrora, foram depostos de seu trono por Sauron. Em seu combate com as trevas, a espada de seu poder foi quebrada, e assim eles também foram subjugados.

Aragorn carrega o peso dessa herança e se entrega inteiramente a serviço do portador do anel, a fim de restaurar seu desventurado reino.

A figura do homem real remete ao homem original; sua verdadeira natureza encontra-se no mais profundo do seu ser e, ao mesmo tempo, ela o perturba.

Por um lado ele está ligado às trevas, sua natureza da Terra Média, e por outro lado, ele reconhece a Luz e se esforça para servi-la e assim reconquistar sua realeza.

Ele não conhece o caminho, mas confia nos seus amigos.

É fácil nos identificarmos com Frodo e os outros hobbits, pois são muito naturais, adoram comer e beber bem, festejar e divertir-se. Eles vivem nos buracos aconchegantes do belo Condado. 

Melhor dizendo, eles preferem nada saber sobre o mundo que os rodeia. 

Mas alguns possuem uma alma aventureira. Frodo e os três hobbits deixam sua pátria. Eles são tão pequenos que nunca tiveram um papel especial na Terra Média. Mas é justamente devido a essa independência que estão aptos para chegar ao fim do mistério do anel.

Frodo está de posse do anel há pouco tempo, quando Gandalf lhe relata o
poder e o significado dessa jóia. Mesmo sentindo-se muito pequeno e muito
frágil para uma tão pesada tarefa, ele se prepara para empreender a perigosa
viagem para as ravinas da Montanha da Perdição. 

Ele não conhece o caminho, mas confia nos companheiros.

Mesmo nos momentos de dúvida, ele sabe, interiormente, que tudo está certo e que deve perseverar para conseguir destruir o anel. Portanto, não se trata de um caminho que alguém escolhe por ser particularmente romântico, excitante ou glorioso. 

Esse caminho que conduz ao aniquilamento do poder cíclico do anel do mal provém
de uma vocação interior.

O papel de Frodo coloca em evidência a ligação que existe entre todas as criaturas do universo. Grandes ou pequenas, fortes ou fracas, elas estão ligadas entre si, em unidade. Elas provêm da unidade divina e se manifestam em miríades de entidades de infinita diversidade. 

Cada criatura, por menor que seja, onde quer que se encontre, é uma engrenagem no mecanismo universal. Por esse motivo, o menor de seus atos é importante para o todo; elas influenciam o conjunto.

Na comitiva dos nove, com Gandalf, Aragorn e os outros, Frodo é o único que pode carregar o anel. Ele não possui muita força e nem luta para ter poder ou riquezas. 

Mas ele é puro, corajoso e suficientemente inteligente para compreender a tarefa da qual está incumbido e pôr-se a caminho. Contudo, acontece-lhe de exprimir,
no coração da montanha de Mordor, suas dúvidas: 

"Gostaria que isto nunca tivesse acontecido." 

E as palavras de Gandalf ressoam em seus ouvidos:

"Cabe a cada um decidir o que fazer com o tempo que lhe é concedido."

O filme terminou. O espectador está saturado de batalhas da Terra Média e retorna a sua própria realidade cotidiana. 

Mas em sua miséria interior, algo ainda vibra por um tempo. Será que ele realmente comprovou sua ligação com todas as formas de vida e seu próprio
lugar nisso tudo? Ele se lembra de algo a esse respeito? Talvez ocorra com ele o mesmo que aconteceu com Frodo em seu desespero. 

Devo decidir o que fazer com o tempo que me é concedido.

*O autor J.R.R. Tolkien nasceu em 1892, na África do Sul. Estudou
universidade de Oxford. Em 1924, foi professor de língua e literatura inglesa e, um ano mais tarde, obteve uma cadeira em Angelsaksich. Em seu livro J.R.R. Tolkien, uma Biografia, Humphrey Carpenter escreve:

Era 19 de setembro de 1931. Após um almoço coletivo no Magdalen College, três homens vão dar um passeio na margem do rio. 

Eram eles: Tolkien, filólogo e professor em Angelsaksich, C.S. Lewis, professor e futuro escritor de literatura infantil, e Hugo Dyson, conferencista de letras inglesas. 

Eles falam sobre os mitos na literatura e de seu grau de veracidade. Lewis afirma que os mitos são mentiras.

Tolkien replica: "Não, não são mentiras". 

Mostrando as árvores, ele diz: "Denominamos uma árvore de árvore, sem refletir a respeito. Mas não há árvore enquanto ninguém pronunciar essa palavra.

Denominamos estrela uma estrela, e dizemos que é uma bola de matéria que segue uma trajetória matematicamente definida. Mas é somente o que vemos.

Dando um nome às coisas e descrevendo-as, exprimimos o que percebemos. 

E, assim como uma língua é um sistema de conceituação dos objetos e das idéias, o mito é um sistema de conceituação da verdade.

Tolkien prossegue: "Nós procedemos de Deus, mas é inevitável que os mitos, que nós mesmos criamos, comportem erros, pois eles nada mais são do que fragmentos refletindo a verdadeira luz, a eterna verdade que é de Deus. 

Ao inventar um mito, ao tornar-se “subcriador” por inventar um conto, o homem pode se esforçar pelo estado de perfeição que ele conhecia antes da queda.

Talvez nossos mitos desencaminhem, mas eles nos orientam para o porto correto,
por mais tortuoso que seja o caminho que conduz a ele. 

A "porta de entrada" da matéria, ao contrário, só conduz a um perigo medonho,
à coroa de ferro das forças do mal.

* Hoje a palavra mito, significa alguma coisa inveridica, irreal ou ficticia. Entretanto ela deriva do vocábulo grego mythos, que em seu uso original significa uma explicação da realidade que lhe confere significado.

terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

OS VERSOS ÁUREOS DE PITÁGORAS



Mestre Pitágoras viveu há dois mil e quinhentos anos, numa colônia grega conhecida hoje pelo nome de Sicília. Com frequência ele é citado de um só fôlego com Hermes, Zoroastro e Platão, e é incluído entre os maiores sábios. 

É dele que nos vem a palavra filosofia: amor à sabedoria. Em sua opinião, o homem deve, primeiro, esforçar-se para alcançar a pureza da alma. Isso seria algo natural, se o homem respeitasse tudo o que vive, se refletisse acerca do universo onde reinam a regularidade e a harmonia e onde miríades de coisas crescem e se expandem naturalmente em seu próprio ritmo. Nesse macrocosmo majestoso,
o número, o valor dos números e suas relações determinam tudo o que se manifesta.

De acordo com a lenda, Pitágoras podia estar em muitos lugares ao mesmo tempo. Metaforicamente, também é possível afirmar isso nos dias de hoje, pois sua influência se faz sentir em toda parte: na filosofia, na ética, na astronomia, na
música e na matemática. A combinação entre música e astronomia pode ser observada na expressão “a música das esferas”.

Nesse contexto, Shakespeare também dá sua contribuição em O mercador de Veneza: 

“Vem aqui, Jéssica, vê como a abóbada celeste está incrustada de pontos de ouro que cintilam. Cada corpo celeste que vês, por pequeno que seja, segue
sua órbita cantando como um anjo no coro dos sempre jovens querubins. Assim a harmonia ressoa nas almas tornadas imortais. Mas, enquanto estivermos revestidos de argila, ela permanecerá inaudível para nós”.

Os pitagóricos formavam comunidades com determinadas regras de vida, as quais, para nós, se apresentam fora de seu próprio contexto. Segundo Dicaiarcos, Pitágoras afirmava que a alma é imortal. 

Tudo o que ocorre reaparece no curso da rotação do tempo e de acordo com determinados ciclos, e, por conseguinte, em verdade, nada é novo.

Tudo renasce com o que tinha antes ao seu redor, pois a vida decorre justamente em ligação com tudo o que a circunda. Homens e mulheres eram membros da escola pitagórica; todos os seus bens eram partilhados, e todos viviam em comunidade.

As descobertas nos domínios da música, da matemática ou da astrosofia eram consideradas como bens comuns e atribuídas, no sentido místico, a Pitágoras, mesmo após sua morte.

Os pitagóricos seguiam uma ética na qual a vida contemplativa ocupava o lugar principal: 

"Somos estrangeiros neste mundo; o corpo é o túmulo da alma. Mas não devemos fugir dele pelo suicídio, porque somos bens e propriedade de Deus, nosso pastor, e sem sua ordem não temos o direito de evadir-nos." 

Há três espécies de homens, exatamente como nos jogos olímpicos. A classe inferior é a dos que vêm comprar e vender, a seguinte, a dos competidores; e, acima de todos, os que simplesmente veem. 

A maior purificação é, portanto, a ciência desinteressada, e o homem que a ela mais se dedica, o verdadeiro filósofo, é quem mais se liberta da roda dos nascimentos”.

A palavra “teoria”, diz o filósofo moderno Bertrand Russel, é originalmente uma palavra “órfica”, isto é, um conceito proveniente de um antigo movimento religioso místico que considerava aalma como um elemento divino, tendo a possibilidade
de libertar-se do corpo após uma série de reencarnações. Poderíamos interpretar a palavra “teoria” como: uma “contemplação simpática e fervorosa”. Uma teoria pode levar a um saber científico ou a uma compreensão profunda. 

Assim, essa palavra, passando pelos pitagóricos e chegando até nossos dias, tomou progressivamente seu atual significado, mas para os que se deixam inspirar por Pitágoras ela conserva algo de uma manifestação extática.

Algumas das regras de vida dos pitagóricos foram transmitidas mediante Os versos áureos de Pitágoras.

Apresentamos aqui alguns fragmentos dessa antiga Sabedoria.

OS VERSOS ÁUREOS DE PITÁGORAS

Primeiro, honra os deuses imortais, como a lei estabelece, e venera o juramento, depois os heróis dignos de honra, e os gênios do mundo inferior, executando as prescrições da lei.

Honra também teus pais e parentes mais próximos; e, entre os outros, escolhe como amigo o melhor em virtude; cede às palavras doces e aos trabalhos úteis, e não te desavenhas com teu amigo por causa de pequena falta, tanto quanto
possas, pois o poder habita junto à necessidade.

Sabe que estas coisas, por um lado, são assim; por outro, habitua-te a dominá-las: sobretudo o estômago, o sono, e a sexualidade, e a ira; e nunca faças algo vergonhoso, quer com outros, quer sozinho; porém, acima de tudo respeita a ti mesmo.

Depois, sê justo em palavras e ações; habitua-te a nunca comportar-te sem refletir; porém, sabe que morrer é o destino de todos.

Quanto às riquezas, aceita por vezes adquiri-las, e por vezes perdê-las.

E tudo o que, pelos destinos divinos, os mortais recebem de dores, se disso tens tua parte fatal, suporta-a e não te indignes; porém é a cura que convém, tanto quanto te seja possível; e reflete desta maneira: que aos bons o destino não dá
muito desses sofrimentos.

Muitas palavras vis ou virtuosas são pronunciadas diante dos homens, que elas não te turbem; e não te permitas desviar-te por elas.

Se alguma mentira for dita, sê brando. O que te digo se cumpra em qualquer circunstância: Ninguém jamais deve levar-te, por palavras ou por ações, a fazer ou a dizer algo que não seja o melhor para ti.

Delibera antes da ação, para não haver consequências censuráveis: pois agir e falar sem reflexão são coisas de um homem fraco; mas cumpre essas coisas, a fim de que mais tarde não te entristeçam.

Nada faças que não entendas, porém aprende tudo o que te é necessário; e levarás assim a mais agradável vida. Também não negligencies a saúde do corpo;
porém, na bebida, na comida e na ginástica, sê comedido. Chamo medida tudo o que não te entristecerá.

Habitua-te a um modo de vida puro e sem indolência; e evita fazer tudo que cause inveja. Não gastes fora de medida, como o que ignora a beleza, nem sejas avarento: a medida em todas as coisas é excelência.

Faze o que não te prejudicará e reflete antes de agir.

Não permitas que o doce sono cerre teus olhos antes de teres examinado cada um de teus atos do dia: em que errei? O que fiz? O que não fiz que deveria ter feito?
Começando no primeiro ponto, vai até o fim e em seguida: se cometeste coisas vergonhosas, repreende-te; mas, se agiste bem, regozija-te.

Nessas coisas esforça-te e exercita-te; é preciso que as ames. Elas levar-te-ão aos caminhos da virtude divina; sim, por aquele que deu a tétrada à nossa alma, fonte
da natureza eterna! Agora empreende a tarefa, após orar aos deuses para que a realizem.

Quando tiveres dominado essas coisas, saberás qual é dos deuses imortais e dos homens mortais a constituição, e até que ponto se diferenciam e onde se unem.

E conhecerás, segundo a medida da justiça, que a natureza é em tudo semelhante, de modo que para ti não haja nenhuma esperança do que é sem
esperança, e que nada te permaneça oculto.

E saberás que os homens têm os males que eles mesmos escolheram. Infelizes, que não vêem os bens que estão próximos deles nem os escutam: raros são os que sabem livrar-se do mal.

Essa é a sina que extravia o espírito dos mortais; e, como cilindros que rolam, são jogados para lá e para cá e padecem males infinitos. Triste companheira,
a discórdia inata neles, sem que percebam, os extravia.

Não deves fazê-la avançar, porém cedendo a ela, dela fugir. Zeus pai, por certo livrarias de muitos males todos os homens, se lhes mostrasses de que demônio
eles se servem.

Tu, porém, arma-te de coragem, pois divina é a ascendência dos mortais, aos quais a natureza sagrada revela todas as coisas.

Quando algo dela tornar-se parte tua, dominarás o que te ordeno.

E, após teres curado a alma, salvá-la-ás desses males.

Abstém-te, porém, dos alimentos dos quais falamos, e, tanto nas purificações como na libertação da alma, decide e reflete sobre cada coisa, após ter estabelecido como condutor o juízo cheio de excelência que vem do alto; após abandonares o corpo, se chegares ao éter livre, serás imortal: um deus que não morre, já não um mortal.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Conferência dos Pássaros, um conto SUFI



Simorg é o pássaro fabuloso das antigas narrativas do Oriente, símbolo
brilhante do Príncipe que deve ressuscitar interiormente em todo ser humano.

O conto Conferência dos Pássaros, o sufi Farid ud-Din Attar (1119-1233)
relata como muitos pássaros partem à procura de um rei, e como sua busca os leva por sete vales, ao longo de uma exaustiva peregrinação mas somente trinta dentre eles chegam ao fim. 

O autor desse conto maravilhoso era originário de Nishapur, na Pérsia. Ele escreveu muitos textos líricos e épicos, a maioria datada do fim do século XII,
que refletem sua busca e sua profunda aspiração de encontrar o segredo do amor divino. 

As obras desse místico mostram aos pesquisadores de todas as culturas que só a forma está ligada à época e à tradição, e não a essência. 

A ação que precede e que segue essa experiência autenticamente mística é o
ponto central da obra de Attar. 

Pois é por um comportamento interior libertador que um novo desenvolvimento
pode acontecer. 

A purificação que disso resulta dá acesso ao caminho que conduz ao reino divino interior.

A Conferência dos Pássaros começa no momento em que estes estão reunidos
e exprimem o desejo de encontrar um rei. 

A poupa (ave) ocupa um lugar importante na discussão. 

Em muitas narrativas ela aparece como a enviada de confiança de Salomão junto à rainha de Sabá. “Em seu peito, ela traz o símbolo do conhecimento espiritual; e,
sobre sua cabeça, brilha a coroa da fé.”

Ela é a mediadora que conhece a existência do rei e sabe aonde é preciso ir para procurá-lo. Ela declara que somente a Simorg, “que, na ilha da sublimidade,
mora na cidade da magnanimidade”, é digna da realeza.

No coração dos pássaros nasce um grande desejo e todos querem partir à
procura da Simorg. 

Mas surgem muitos pretextos para não fazer uma viagem tão perigosa. 

Então, a garça real afirma que não pode ficar sem o seu lago. 

Mas a poupa lhe responde: “O lago é mutável e pouco fiel. Um dia, ele te engolirá”. O pavão crê que só ele tem o desejo de retornar ao paraíso.

A poupa replica que o senhor do paraíso é mais importante do que o paraíso. 

As sábias palavras da poupa acabam levando-os à decisão de se manterem em seu projeto inicial. É principalmente o amor dela que lhes dá a força para suplantar seus temores.

Assim reconfortados, os pássaros partem em viagem. 

Mas, surgem novas dúvidas quando eles vêem que, diante deles, no interminável caminho, não encontram nenhum ser vivo.

Angústias ancestrais vêm à superfície.

A poupa responde a um de seus companheiros de viagem, que tem medo de morrer, que a morte é seu destino:

“Tu nasceste para morrer!” Um outro pergunta a que distância se encontra verdadeiramente o objetivo. Então, a poupa lhes relembra longamente os
sete vales que é preciso atravessar.

Depois de muitos anos, só trinta pássaros conseguem alcançar a corte
da Simorg. Eles pedem então para entrar e repousar, mas isso lhes é recusado.

Desesperados, eles se sentem mais do que nunca próximos da morte. 

Somente depois de prestarem contas do que fizeram durante sua vida é que são
absolvidos. 

Por fim, quando seu desejo se transmuta em não desejar, eles recebem uma nova força, e reconhecem que o pássaro Simorg representa verdadeiramente sua aspiração à Luz.

Então se lhes ensina que a realeza é semelhante a um claro espelho, e que aquele que sai desse espelho, se reconhece.

Em seguida, eles desaparecem todos dentro do espelho. 

“A sombra desaparece no sol e isso é o fim.” 

Finalmente, eles entram na imutabilidade depois que tudo o que era antigo desapareceu. Eles se perdem para sempre na Simorg. Já não há viajantes, nem guias. Ao encontrar a Simorg, eles também se encontram a si mesmos, e o
problema do eu e tu é resolvido.

O pesquisador da Verdade certamente reconhecerá algo do seu próprio anelo na aventura desses trinta pássaros. 

A força propulsora nasce com a lembrança da vida original. 

Aos poucos, seu estado o inquieta. É como um fogo. A consciência experimenta
que algo de estranho a este mundo a agita e a inquieta. 

Esta impressão está sempre presente, sejam as circunstâncias tristes ou alegres. 

É aí que começa a Conferência dos Pássaros. 

Após a euforia do início, instala-se o medo de que a viagem seja perigosa. 

A consciência limitada não pode fazer outra coisa senão trazer para o seu próprio
nível o que se situa fora do seu alcance.

Entretanto, fica alguma coisa de indefinível que assim como uma sombra, obscurece toda a alegria e jamais dá descanso.

Pássaros de todas as variedades, de cores e comportamentos diferentes, ilustram bem as inúmeras ilusões humanas, e principalmente a série de objeções, sua extensão e diversidade, em face da escolha que a personalidade deve fazer para se voltar ou não para a Luz. 

Nesse conto simbólico, esses problemas aparecem desde o início.

Os pássaros traduzem todas as características que são obstáculos no caminho da libertação interior: sentimento de indignidade, tendência à melancolia, jugo dos instintos naturais, desejo de posse, tentações e cobiças sempre novas e abandono às emoções sucessivas. 

Todas essas fraquezas surgem a cada instante, se atropelam por detrás de tudo e querem subsistir e dominar. 

E o doce chamado que vem do fundo do coração e incita à autoanálise e à reflexão fica completamente sufocado. 

Essa é a razão pela qual muitos pássaros se perdem durante a penosa viagem através dos sete vales.

Um deles acredita que alcançou o estado da perfeição com exercícios e se recusa a mudar de opinião. 

A poupa o repreende severamente e lhe explica que sua pretensão não pode fazê-lo progredir. 

Ela afirma que o caminho que conduz a Fonte não é para aqueles que são aparentemente perfeitos, mas para aqueles que reconhecem sua imperfeição. 

A pergunta é a seguinte: o pesquisador está centrado em sua própria verdade ou na verdade divina? Será que censuras como as da poupa são um reconforto para ele? Será que ele vai continuar a se aperfeiçoar e a se cultivar negligenciando a
verdadeira finalidade da vida? 

Aquele que se obstina em servir os interesses de seu eu em lugar dos interesses de sua alma, e quer alcançar alguma coisa precisa na vida antes de voltar-se para a Luz, está enganado. 

Ele sempre quer atingir com seu eu um cume que é inacessível para ele! 

Orgulho e presunção o acompanham, e seu eu convive com prazer com esses dois incômodos parceiros.

Mas somente a compreensão de que a escolha inicial é incorreta pode quebrar essa atitude forçada. 

Isto exige uma decisão; e, em seguida, sua realização. 

Somente assim é que o orgulho e a presunção se retiram para dar lugar às qualidades que abrem novas perspectivas.

“Bem” e “mal” são os dois pólos entre os quais a natureza dialética ímpia
se mantém. 

Não se pode vencer o mundo, onde os contrários se alternam, tomando partido pelo pretenso bem ou pelo pretenso mal, a fim de forçar uma situação. 

Este mundo dos opostos oferece a possibilidade de descobrir essa realidade. 

Aquele que se dá conta de que esses aspectos contrários se mantêm mutuamente, e que portanto é impossível desembaraçar-se deles, reconhecerá que os conselhos da poupa são verdadeiros. 

E tirará proveito disso quando for à procura do rei interior. 

Este caminho conduz para fora de todos os aspectos contrários:ele representa uma mudança fundamental e total do ser.

“Devemos ainda percorrer sete vales. Ninguém sabe a que distância eles estão, e aqueles que neles chegaram jamais voltaram”, responde a poupa àqueles que perguntam se a meta ainda está longe. 

Para encontrar a verdadeira finalidade da vida, é preciso passar por experiências.

Nessas condições, não é mais possível voltar atrás: a busca experimental está fora de questão. Estas não são apenas belas palavras: é preciso compreender que os poderes do eu são insuficientes para transpor os limites interiores. 

É isto o que a psicologia deveria aprender e ensinar!

A poupa explica cada um dos sete vales e sua particularidade. 

Assim, há o Vale da Busca, o do Amor, o do Conhecimento, o do Não Desejar, o da
Unidade, o da Confusão e o do Desapego.

“Quando desceres ao Vale da Busca, estarás sempre diante de novas alternativas.

Lá, cada respiração é semelhante a milhares de possibilidades, e mesmo um corajoso papagaio pode tornar-se uma mosca! Durante anos, deves te esforçar ao máximo e fazer o teu máximo possível enquanto teu coração atravessa diferentes situações.

Deves renunciar a toda posse e a todo poder. 

Teu caminho passa pelas profundezas de teu sangue e por tudo o que te é exterior. 

Uma vez que tenhas a certeza de nada mais possuíres, ainda terás que esvaziar teu coração de tudo o que ele contém. 

Se teu coração estiver finalmente ao abrigo da perdição, contemplarás a luz serena de sua majestade divina. 

E se a luz começar a se manifestar em teu espírito, tua aspiração espiritual se multiplicará mil e uma vezes.”

“Depois aparece o Vale do Amor. Aquele que nele chega é mergulhadoo fogo porque neste vale não há nada além de fogo. 

Quem não puder agüentar esse banho de fogo não mais encontrará alegria. 

Ele é um amante, que é como fogo, e que, com o rosto ardente, se consome. 

Ele não hesita: joga seus cem mundos no fogo com alegria. 

Nesse caminho, não existe diferença entre o bem e o mal, pois aqui não existe
nem bem, nem mal. O amor transcende os dois.”

“O peregrino vê aparecer agora o Vale do Conhecimento. Aqui, cada um segue um caminho diferente. O caminho de um nunca se parece com o caminho de outro. Aquele que segue o caminho do corpo não é o mesmo que trilha o caminho da alma. 

Mas para os dois, tanto o corpo quanto a alma, existe sempre, por causa de mau procedimento ou de virtude, uma porta que leva à elevação e uma porta que leva à
perdição. 

E quando o sol do conhecimento brilha no firmamento do caminho mais elevado, cada um reconhece seu verdadeiro valor e seu coração se abre amplamente para a verdade”.

“Em seguida, vem o vale do Não Desejar. 

Aqui não há mais exigências e nada mais tem importância. Os sete oceanos voltam a ser uma simples poça. Os sete planetas não brilham mais que um débil clarão. As sete esferas do paraíso desaparecem aqui, e os sete infernos se cristalizam no gelo.

Não importa o que faças ou deixes de fazer: nada de novo e nada de antigo tem qualquer poder”.


“Então vem o Vale da Unidade, o domínio da completa solidão. 

Somente aqueles que vêm desse deserto têm na cabeça o mesmo turbante. Quer notes aqui agora muito ou pouco em número, é um, contudo, que está nesse caminho da unidade. Porque permanece sempre um em um, e é esse um o Uno,
a unidade perfeita.”

“Agora, é o Vale da Confusão, onde tudo é fonte de dor e tristeza. 

Aqui, cada respiração é como uma espada cortante, e cada batimento de pálpebras é só suspiro e gemido. Os suspiros e as dores são como um fogo. Não se distingue o dia da noite. O sangue escorre, não da espada, mas de cada raiz de
cabelo, e todos os lamentos são registrados.

O fogo é como o gelo comparado ao peregrino que queima e se consome
na sua dor. Ele é jogado na confusão e aí se encontra porque a confusão
lhe fez perder o seu caminho. Aqui aquele que possui a unidade absoluta
inscrita na alma perde tudo, e também a si mesmo.”

“Finalmente, surge o Vale do Desapego.

Quem poderia descrevê-lo? Ele se caracteriza pelo esquecimento, o silêncio,
a surdez e a inconsciência. Basta um único raio de sol espiritual e vês desaparecer todas as sombras ao redor de ti. Quando o oceano do infinito eleva suas ondas, como podem se manter as formas que aparecem na superfície?

Os dois mundos já não são nada além das formas que tu vês na superfície
do oceano. Quem duvidar é vitima de alucinações. Aquele cujo coração se
perde nesse oceano está perdido como nunca e aí repousa em paz...”.

Como se pode perceber pela história, a maior parte dos pássaros sente medo com a descrição dos sete vales.

Finalmente, trinta alcançam a meta.

Mas quando o guardião do palácio os repele, priva-os de suas últimas forças e de sua última esperança. Não obstante, é-lhes apresentado um texto onde estão anotados todos os atos de suas vidas e eles demonstram arrependimento.

Então, o pássaro Simorg perdoa-lhes as faltas. Em outras palavras: no fim do caminho, eles encontram seu verdadeiro ser.

“O brilho do sol do rei é como um espelho. Aquele que se olha nele vê sua alma e seu corpo. Ele se vê por inteiro.”

Muitos aspectos do caminho seguido pelos trinta pássaros são familiares ao buscador da verdade. 

Alcançar a Simorg não é uma atividade do eu, mesmo que seja através do eu que o caminho comece. 

Quando ele se dá conta de que sua mais elevada aspiração acaba se tornando uma decepção, pode abandonar o lugar que outorgou para si durante milênios. 

Farid ud-Din Attar fala sobre o desapego, que implica na remissão de todos os pecados.

Mas por que apenas trinta pássaros alcançam a meta? 

O número trinta representa os três nascimentos pelos quais o peregrino deve passar: a fase preparatória, a fase da nova vida e a fase do retorno. 

O zero indica que a fase foi cumprida. 

Em outras palavras: a fase anterior deve ser levada a um bom fim para que a fase seguinte possa começar.

“Ele viu um novo céu e uma nova terra,” diz o Apocalipse. Eles entraram “no que é permanente, depois que todo o antigo desapareceu”.

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012





“A candeia do corpo são os olhos. De sorte que, se teus olhos forem bons, todo o teu corpo será luz. Se, porém, os teus olhos forem maus, o teu corpo será tenebroso. Se, portanto, a luz que em ti há são trevas, quão grandes serão tais trevas!” Mestre Jesus, o Cristo (Mateus, 6:22)

O homem comum é limitado pela luz que seu olho capta, ou seja, pelos fenômenos que acontecem a seu redor. 

Ele está habituado a identificar-se com mundo que o rodeia, com lado externo das coisas, o que se tornou cada vez mais importante. 

Este esplendor e este brilho mascaram sua pobreza interior. 

O que uma pessoa pretende ser, sua imagem, começa a tornar-se mais importante do que aquilo que ela é realmente.

O olho “mau” não poderá dissipar a ilusão deste mundo, pois ele não está
completamente satisfeito com tudo o que vê. 

Deste modo, nenhuma luz verdadeira pode penetrar o ser humano como criatura microcósmica, e todo o seu corpo continua nas trevas.

A multiplicidade dos contrários é a marca do mundo. 

Quase sempre, somente percebemos as diferenças entre os fenômenos e ninguém é capaz de vê-los como uma unidade. 

E não poderia ser de outra forma, pois o homem perdeu o contato com sua própria
unidade e assim ficou condenado a conhecer a si mesmo dentro de um caos interior. 

Como ele comeu do fruto da “árvore do conhecimento do bem e do mal” e somente vê oposições, a “árvore da vida” tornou-se inacessível para ele.

Quando o olhar se volta do exterior para o interior, é possível comer o fruto
da “árvore da vida”. 

O olho que quer-se tornar simples deve aprender a se desligar do mundo das oposições, e isto não é fácil. 

Primeiro, é preciso descobrir que, na natureza, cada força atrai uma força contrária. 

Para atingir a tranqüilidade, é preciso conseguir ter uma relação completamente diferente com a natureza. 

Se possível, é preciso deixar o mundo em calma para depois conseguir sua própria calma e é com este propósito que os frutos da “árvore da vida” nos vêm ajudar.

De fato, este novo alimento, que provém de um outro campo de vida, concede a força de ultrapassar as oposições da natureza perecível e de seguirem frente, em meio ao mundo, a caminho do mundo da unidade.

O homem traz a unidade dentro de si mesmo, e este único vestígio divino está
sempre lhe dizendo: “Eis que estou à porta e bato: se alguém ouvir a minha
voz e abrir a porta, entrarei em suacasa...”. (Apocalipse, 3:20). 

Um novo rumo lhe será dado, para que ele possa sair do mundo dos opostos. 

Este rumo lhe trará a paz e apagará dentro dele os desejos deste mundo.

Surgirá para ele um novo preceito:

“Busca primeiro o Reino de Deus e todo o resto te será dado em acréscimo”.

Será estabelecida uma nova relação com o mundo: ele já não terá necessidade,
como antes, de buscar o que é preciso para viver, pois isto lhe será oferecido. 

Ele receberá tudo o que necessitar para o crescimento da nova alma.

Portanto, a maneira pela qual o olho vê determina a qualidade do corpo astral e
do corpo mental. 

É por esta razão, também, que ele é chamado de “espelho da alma”. 

Jacob Boehme explica, em seu "Diálogo entre o mestre e o discípulo":

“Teu olho direito vê na eternidade. O olho esquerdo olha para trás, no tempo.
Se te permites sempre olhar a natureza e as coisas do tempo, não atingirás
jamais a unidade que tanto desejas. Deixa disto e fica atento. Não permitas a
teu espírito que percorra o que é exterior ou que se satisfaça com isto; e não
voltes teu olhar sobre ti mesmo... Não deixes que teu olho esquerdo te induza
a erro, evocando a todo o momento uma idéia depois da outra; mas que teu olho
direito conduza o esquerdo... E é somente levando o olho do tempo no olho da Eternidade e... descendo na luz da natureza graças à luz divina... que conseguirás atingir a unidade de visão, ou a vontade unificada”.

Nós vos dizemos isto para que vejais claramente que o homem que ainda não está ‘inflamado pelo Espírito divino’, que conseqüentemente ainda não abriu seu olho direito para a luz da Gnosis, em realidade é "caolho".