sexta-feira, 30 de março de 2012







Há quatro espécies de homens:

O que não sabe e não sabe que não sabe: é tolo - evita-o;
O que não sabe e sabe que não sabe: é simples - ensina-o;
O que sabe e não sabe que sabe: ele dorme - acorda-o;
O que sabe e sabe que sabe: é sábio - segue-o."

Comunicação é uma palavra mágica.

No entanto, uma boa conversa nunca esteve tão pouco em evidência.

O verdadeiro diálogo parece ter perdido grande parte de sua importância, agora que a comunicação humana acontece mais por meio de e-mails, sms ou
Facebook.

As mídias estão dominando nossa vida e nos sobrecarregam de uma quantidade incrível de informações.

As conversas giram principalmente em torno do que as mídias nos trazem, e falamos cada vez menos sobre o que poderíamos dizer a nós mesmos.

O mais importante é estar por dentro das novidades, estar bem informado.

Quem não estiver, só pode calar-se, não pode dizer nada, nem participar da conversa.

Acomunicação pessoal deixa transparecer muito da confusão de informações que mantém nossa “comunidade global” aprisionada.

Todas as pessoas, individualmente, precisam ter uma opinião bem formada, cheia de argumentos e justificada com veemência.

Nosso mundo de informações está ameaçado por uma polarização a ponto de ser quase uma obrigação tomar o partido de um lado e menosprezar o outro.

Para sermos claros, apegamo-nos a opiniões radicais. A hesitação e a incerteza tornam difícil a formação de opinião.

Exige-se uma opinião firme a respeito dos assuntos mais divergentes possíveis e sempre precisamos justificar, dar exemplos para fundamentá-la.

Isso é bem lógico, pois nossas conversas geralmente caem em discussões, debates
brigas, e sempre nos perdemos em uma avalanche de palavras.

Por isso, estamos chegando a um ponto em que vale mais ter razão do que dizer a verdade.

Trata-se de uma antiga técnica de discussão praticada entre os sofistas na antiga Grécia, e eles chegavam até a ser remunerados por ela! Vencia quem tinha razão, e a vitória era dada a quem pronunciasse a última palavra.

Sócrates Por ser o “pai do diálogo socrático”, ele atraía a hostilidade dos sofistas.

Sócrates não era um mestre da conversa cotidiana sobre “tempo bom” ou “tempo ruim”.

Pessoalmente, ele também não queria convencer ninguém a qualquer preço.

Mas ele acabou colocando em dúvida todas as falsas certezas de seus interlocutores.

Como ia fazendo perguntas cada vez mais profundas, ele os levava a tomar consciência de que realmente não sabiam nada.

Desse modo, resumia a conversa e dava fim a toda tagarelice das pessoas muito seguras de si.

Sócrates colocava-se como um exemplo, pois dizia que também não sabia nada a respeito de nada e que não achava que poderia saber de tudo. De certa forma, só de dizer isso ele já se mostrava mais sábio do que os outros.

Karen Armstrong tem razão quando se refere ao método de diálogo socrático em seu novo livro, Em nome de Deus (The Case for God). Segundo ela, as polêmicas sobre as grandes questões vitais são sempre improdutivas, pois impedem que a pessoa vivencie experiências espirituais autênticas e nunca conduzem à iluminação.

Em um bom diálogo, precisamos confrontar nossas opiniões com a de outra pessoa e deixar claro, logo de início, que não pretendemos saber tudo a respeito do assunto.

Ao fazer isso, não registramos um resultado imediato, sobretudo se nos esforçarmos muito conscientemente. Nesse caso, é importante reconhecermos isso honestamente: assim, poderemos dar uma nova direção ao diálogo.

Afinal, é preciso manter uma atitude aberta e receptiva, que nos permita perceber onde discordamos, para nos livrarmos de nossas certezas cristalizadas e da fortaleza inexpugnável de nossa personalidade presunçosa.

Se um dos dois interlocutores apresenta suas ideias como se fossem absolutas e totalitárias, como verdades indiscutíveis, a conversa para por aí.

Portanto, além de nos abrirmos para a outra pessoa, também precisamos relativizar nosso discurso.

De fato, uma boa conversa pode tornar-nos receptivos ao mistério desse terceiro elemento imperceptível: o silêncio que se estabelece entre os interlocutores, o “Outro”, que é tão diferente de nós, e que está presente entre as palavras expressas ou entre as linhas escritas, o “Outro”, que jamais poderá ser reduzido a uma verdade que possa ser demonstrada e definida objetivamente e que permanece quando tudo já foi dito.

Ora, esse “Outro” apenas pode manifestar-se em nós no silêncio: não somente o silêncio da voz, mas principalmente o silêncio do coração, que se faz quando o diálogo chega a um ponto em que nos faltam palavras, quando o silêncio não é
o silêncio teimoso e decidido de quem não querouvir mais nada, mas sim quando há uma espera tranquila pela palavra libertadora que faz com que, em nosso interior, se eleve “o indizível, o inexprimível”.

Esse silêncio também pode descer em nós quando cessa a onda interminável de reflexões pessoais, do diálogo que se desenvolve dentro de nós e que é definido por James Joyce como “fluxo de consciência” (stream of consciousness).

É que o debate a respeito de palavras nem sempre está fora de nós. Na maior parte do tempo, ele continua dentro de nós como um interlocutor imaginário, um adversário que gostaríamos de convencer com base em nosso próprio raciocínio.

Quantas vezes não ficamos cansados de tanto imaginar argumentos para um próximo debate, argumentos que gostaríamos de ter continuado a tecer, quando na verdade ficamos de boca calada? Críticas pedantes? A história da religião dá inúmeros exemplos de pessoas que dialogam como Deus “delas”.

Fazendo isso, apresentam seu "Deus”, como a única verdade uma luta desigual com o produto de sua própria imaginação, sob o império de uma criação demoníaca que as força a uma obediência muda e que submete sua fé de forma autoritária.

No fim, elas acabam perdendo totalmente a fé e negam a existência de Deus.

No entanto, uma negação como essa também pode ter um efeito purificador, pois o choque da ignorância pode fazer-nos transcender a nós mesmos e tornar-nos acessíveis interiormente ao mistério indizível da vida, como podemos ler, por exemplo, na Bíblia, no Livro de Jó.

O silêncio interior pode formar a terra que nos alimentará: a base em que os impulsos pessoais naturais acabam permitindo a escuta da palavra divina.

Nesse momento, dentro de nós somente restará uma única expressão, o anseio pelo único Verbo verdadeiro: “Fala, e serei curado”. Já não se trata de falar de modo puramente informativo ou descritivo, mas, sim, de formular o pedido por uma transformação, por uma mudança fundamental.

Quando a polêmica interior se reduz ao silêncio, o único Verbo divino pode fazer-se ouvir e renovar-nos inteiramente. Na tradição gnóstica cristã, trata-se do Logos.

Esse Verbo se expressa também por meio de nossas ações e de nossa atitude de vida, por uma afirmação que acaba com nossas “belas palavras” que, no entanto, são vazias.

Esse Verbo fala em nós no momento em que o vivenciamos e o escutamos em silêncio.

O que podemos dizer quando o Verbo divino do “Outro em nós” se faz ouvir?

Quando esse Verbo ressoa em uma conversa? Já não pretendemos convencer, persuadir nem sustentar opiniões contrárias: convidamos uns aos outros a ultrapassar as palavras e a descobrir a verdade transcendente que ultrapassa todas as palavras. A partir de então, a comunicação já não é uma troca de ideias diferentes, mas, sim, uma união, no sentido verdadeiro desse termo.

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