segunda-feira, 26 de março de 2012

Trechos dos Versos Áureos de Pitágoras




A nada dês início sem antes invocar a bênção dos deuses.

Pensa antes de agir, para que nada faças de insensato.

Somente um tolo age sem refletir.

Nada faças que não compreendas, e aprende o que te é necessário.

Assim levarás uma vida agradável.

Quaisquer que sejam os sofrimentos que o destino te reserve, em nome de
Deus, suporta-os com paciência e sem queixumes.

Esforça-te para melhorar a tua vida, e pensa que o destino nada envia de insuperável aos homens justos.

O que quer que alcances, permanece fiel ao meu ensinamento.

A cura da alma pode te preservar de numerosas desgraças.

Aplica-te em aprender a dominar tuas paixões; inicia pela cupidez, continua, a seguir, pela indolência, a sensualidade, e por fim a cólera.

Que teus olhos cansados não se fechem antes de te fazeres estas três perguntas:

Que fiz hoje? Que fiz de mal? Terei eu feito o que devia? Repassa todos os teus
atos, do primeiro ao último. Se compreenderes que agiste mal, repreende-te em espírito. Se agiste bem, regozija-te.

E mantém a coragem: os homens são de origem divina; tal é a natureza santa que lhes desvela os segredos mais profundos; o divino não encontra nenhum lugar sobre a terra, e quanto mais a natureza da alma a ele corresponde,mais ela é santa e pura.

Os teólogos e sacerdotes de antigamente testemunhavam que a alma, devido a um castigo, havia sido ligada ao corpo onde ela se encontra sepultada como numa
tumba.

Tudo quanto vemos quando despertos está morto, e sonha quando dormimos.

Que a razão, este dom divino, seja teu guia supremo.

Ali onde existe a justa compreensão atua o divino; ali onde ela é má, atua o mal.Ao te dissociares do corpo mortal e te elevares no éter, te tornas um deus incorruptível e imortal: a morte já não tem poder algum sobre ti.

Os Versos Áureos de Pitágoras foram recolhidos na Antiguidade por Jâmblico.

Eles são provenientes dos ensinamentos de Pitágoras e foram conservados por
um certo número de seus alunos.

Marsilio Ficino, o tradutor do Corpus Hermeticum, publicou-os em 1490.
 

sexta-feira, 23 de março de 2012

E Trabalhem em silêncio.



“Ainda não estamos em condição de abrir os olhos de nosso ânimo e contemplar a imperecível e inimaginável beleza do bem. Somente a verás quando aprenderdes a já não falar dela, porque a Gnosis do bem é tanto silêncio divino como o silenciar de todos os sentidos.
Quem uma vez a encontrou já não pode dar atenção a nenhuma outra coisa. 
Quem uma vez a vislumbrou já não pode ter olhos nem ouvidos para outra coisa, porque até seu corpo participa da imobilidade. 
Porque enquanto todas as percepções e estímulos corpóreos desaparecem de sua
consciência, ele permanece na quietude.”
Hermes Trismegisto - Corpus Hermeticum

O silenciar de todos os órgãos dos sentidos acontece concomitantemente com o participar do silêncio insondável da natureza fundamental.

Então, o ânimo, tal como Hermes o denomina, desperta.

Ele é a unidade entre a cabeça e o coração. O ânimo experimenta um repouso interior inabalável de grande intensidade.

Nesse silêncio, é inflamado um fogo em perfeita suavidade.

E a energia desse fogo brando nutre o inteiro sistema corporal, a fim de que o silêncio recém-nascido, a paz interior, seja fortalecida.

Assim, nosso inteiro ser torna-se maduro para perceber a voz do silêncio
 

Quem não ama a solidão, não ama a liberdade.. - Arthur Shopenhauer





Nenhum caminho é mais errado para a felicidade do que a vida no grande mundo, às fartas e em festanças (high life), pois, quando tentamos transformar a nossa miserável existência numa sucessão de alegrias, gozos e prazeres, não conseguimos evitar a desilusão; muito menos o seu acompanhamento obrigatório, que são as mentiras recíprocas.
Assim como o nosso corpo está envolto em vestes, o nosso espírito está revestido de mentiras. Os nossos dizeres, as nossas acções, todo o nosso ser é mentiroso, e só por meio desse invólucro pode-se, por vezes, adivinhar a nossa verdadeira mentalidade, assim como pelas vestes se adivinha a figura do corpo.

Antes de mais nada, toda a sociedade exige necessariamente uma acomodação mútua e uma temperatura; por conseguinte, quanto mais numerosa, tanto mais enfadonha será. Cada um só pode ser ele mesmo, inteiramente, apenas pelo tempo em que estiver sozinho. Quem, portanto, não ama a solidão, também não ama a liberdade: apenas quando se está só é que se está livre.

A coerção é a companheira inseparável de toda a sociedade, que ainda exige sacrifícios tão mais difíceis quanto mais significativa for a própria individualidade. Dessa forma, cada um fugirá, suportará ou amará a solidão na proporção exacta do valor da sua personalidade. Pois, na solidão, o indivíduo mesquinho sente toda a sua mesquinhez, o grande espírito, toda a sua grandeza; numa palavra: cada um sente o que é.

Ademais, quanto mais elevada for a posição de uma pessoa na escala hierárquica da natureza, tanto mais solitária será, essencial e inevitavelmente. Assim, é um benefício para ela se à solidão física corresponder a intelectual. Caso contrário, a vizinhança frequente de seres heterogéneos causa um efeito incómodo e até mesmo adverso sobre ela, ao roubar-lhe seu «eu» sem nada lhe oferecer em troca. Além disso, enquanto a natureza estabeleceu entre os homens a mais ampla diversidade nos domínios moral e intelectual, a sociedade, não tomando conhecimento disso, iguala todos os seres ou, antes, coloca no lugar da diversidade as diferenças e degraus artificiais de classe e posição, com frequência diametralmente opostos à escala hierárquica da natureza.
Nesse arranjo, aqueles que a natureza situou em baixo encontram-se em óptima situação; os poucos, entretanto, que ela colocou em cima, saem em desvantagem. Como consequência, estes costumam esquivar-se da sociedade, na qual, ao tornar-se numerosa, a vulgaridade domina.

Arthur Schopenhauer, in 'Aforismos para a Sabedoria de Vida'
 

domingo, 18 de março de 2012

SAMA - Rumi - O Poeta Embriagado de Deus




Viemos girando
do nada,
espalhando estrelas como pó.
As estrelas puseram-se em círculo
e nós no centro dançamos com elas.
Como a pedra do moinho,
em torno de Deus
gira a roda do céu.
Segura um raio dessa roda
e terás a mão decepada.
Girando e girando
essa roda dissolve
todo e qualquer apego.
Não estivesse apaixonada,
ela mesma gritaria - basta!
Até quando há de seguir esse giro?
Cada átomo gira desnorteado,
mendigos circulam entre as mesas,
cães rondam um pedaço de carne,
o amante gira em torno
do seu próprio coração.
Envergonhado ante tanta beleza
giro ao redor da minha vergonha.
................................................
Ouve a música do samá.
Vem unir-te ao som dos tambores!
Aqui celebramos:
somos todos Al-Hallaj dizendo: “Eu sou a Verdade!”
Em êxtase estamos.
Embriagados sim, mas de um vinho
que não se colhe na videira;
O que quer que pensem de nós
em nada parecerá com o que somos.
Giramos e giramos em êxtase.
Esta é a noite do sama
Há luz agora.
- Luz ! Luz!
Eis o amor verdadeiro
que diz a mente: adeus.
Este é o dia do adeus.
- Adeus ! Adeus !
Todo coração que arde
nesta noite
é amigo da música.
Ardendo por teus lábios
meu coração
transborda de minha boca.
Silêncio!
És feito de pensamento, afeto e paixão.
O que resta é nada
além de carne e ossos.
Por que nos falam
de templos de oração,
de atos piedosos?
Somos o caçador e a caça, Outono e primavera,
Noite e dia,
O Visível e o Invisível.
Somos o tesouro do espírito.
Somos a alma do mundo,
livres do peso que vergasta o corpo.
Prisioneiros não somos
do tempo nem do espaço
nem mesmo da terra que pisamos.
No amor fomos gerados.
No amor nascemos

sábado, 17 de março de 2012

Amai-vos...





Amai-vos um ao outro,
mas não façais do amor um grilhão.

Que haja, antes, um mar ondulante
entre as praias de vossa alma.

Enchei a taça um do outro,
mas não bebais da mesma taça.

Dai do vosso pão um ao outro,
mas não comais do mesmo pedaço.

Cantai e dançai juntos,
e sede alegres,

mas deixai
cada um de vós estar sozinho.

Assim como as cordas da lira
são separadas e,
no entanto,
vibram na mesma harmonia.

Dai vosso coração,
mas não o confieis à guarda um do outro.

Pois somente a mão da Vida
pode conter vosso coração.

E vivei juntos,
mas não vos aconchegueis demasiadamente.

Pois as colunas do templo
erguem-se separadamente.

E o carvalho e o cipreste
não crescem à sombra um do outro.
 

Misteriosa Sabedoria



Não deve ter escapado a ninguém que o mercado de livros há algum tempo vem sendo invadido pelo que se poderia chamar de thrillers (romance de aventura) religiosos. 

Há certo fascínio por conhecimentos ocultos, mensagens secretas, grupos e forças ocultas, neles existem invariavelmente códigos enigmáticos e sociedades secretas em jogo. Símbolos impenetráveis de um passado longínquo dão indicações corretas, e por fim comunidades misteriosas revelam seus últimos segredos. Além do mais, deparamo-nos com vestígios de manuscritos esquecidos e relíquias desaparecidas, tais como a Arca e o Graal. 

Vencidos eram os pretensos heréticos, isto é, os gnósticos, os maniqueus, os bogomilos, os cátaros e tantos outros. 

E hoje, embora nossa visão da história encontre-se totalmente deformada, os aspectos da verdade são progressivamente trazidos à luz. 

Assim, no decorrer de nossas leituras, a verdade oculta pode ser-nos transmitida, e o enredo de um thriller revelar-nos o objetivo de nossa
própria busca interior.

Já há tempos essa expectativa havia sido despertada por muitas obras esotéricas populares. No gênero thriller, o desejo de sabedoria original e a revelação dos últimos mistérios é introduzido muito habilmente.

Nesses thrillers é sempre mantida a ilusão de que podemos encontrar concretamente a verdade e fazer que ela se manifeste pura e simplesmente, por exemplo, como resultado de uma pesquisa científica ou de uma investigação jornalística. 

Mas o verdadeiro mistério interior não poderia também deixar de
escapar a todas as pesquisas feitas no mundo exterior. 

Visto que nesse caminho somente se encontra o envoltório das formas cristalizadas que encobrem a verdade, ou seja, as formas densas, jamais será possível encontrar nele a verdade vivente, pois, embora ela venha a este mundo, ela não é deste mundo, e por isso não pode ser encontrada aqui.

“Acaso não é ilusório vos afagar sob um reflexo caricatural da luz? Acaso não é necessário retornar ao Tao enquanto ainda é possível?” A confusão é que, naturalmente, em todas essas descobertas e revelações algo da verdade mesma, da Luz única, é refletido.

Está claro que nesses thrillers modernos, como em todos os mitos e lendas antigas, se ocultam muitos reflexos da verdadeira busca espiritual, porém de modo inconsciente, sob forma alegórica, sem que o autor conheça
toda a sua extensão nem que ele próprio viva essa busca conscientemente.

Diferente de um livro cativante que trata de um crime fictício e outros envolvimentos, deu-se, no início dos tempos, no plano espiritual,
um incidente que envolveu toda a humanidade. 

Esse incidente deve ser anulado porque o homem, ao tornar-se consciente,
elimina as causas do tempo, do sofrimento e também da obrigação de “ganhar o pão com o suor do seu rosto”. 

Esse incidente sobre o qual não podemos falar senão de maneira
aproximativa é qualificado de “queda”.

O homem original, nascido da unidade original divina, em sua temeridade evocou, um dia, forças adversas que o desviaram de sua verdadeira evolução.

Ora, no caminho do restabelecimento da glória do homem divino e do ingresso final no mistério divino, o homem deve afastar corajosamente inúmeros obstáculos. 

Sua vida será julgada de acordo com seu engajamento pessoal, sua inteligência crescente e seu profundo anseio pela Verdade. 

Tudo se desenvolve diante de um cenário: a dura realidade da vida, onde os acontecimentos externos apresentam um símbolo do que se desenvolve no plano interior. 

Como num thriller, os mosaicos giram na cabeça da pessoa que segue esse caminho, enquanto as numerosas peças do quebra-cabeça se dispõem
progressivamente uma ao lado da outra para revelar a verdade. 

Desse modo, a busca interior tem um final feliz, um “bom fim”, segundo a expressão cátara. No meio da grande confusão o buscador consegue, por fim, encontrar muitos pontos de referência.

Muitos desses livros referem-se incidentalmente a fatos históricos, mais concretamente a um tesouro escondido, aos templários, a Salomão, ou então aos cátaros etc.

Neles se busca um tesouro que pode ser encontrado em lugares lendários como Glastonbury, Rosslyn, Rennes le Château. 

Às vezes o tesouro é material, e tem-se em vista o túmulo de Jesus, ou então sai-se em busca de seus ossos. 

É bastante comum atualmente basear o enredo de um thriller na idéia de que a posteridade de Jesus, considerado como personagem histórico, ter-se-ia perpetuado até nossos dias, em uma dinastia real, por exemplo, que seria designada como a família do Graal, os merovingios. 

Inevitavelmente, a figura de Maria Madalena é mencionada como sendo
a companheira do Mestre Jesus, o Cristo ou sua legítima esposa, hipóteses geralmente ilustradas por referências bíblicas apropriadas e por lendas da Idade Média. 

Numa leitura feminista da Bíblia, Maria Madalena serve de figura de
proa que se propõe corrigir a parcialidade patriarcal desse livro, de modo que freqüentemente Madalena é a personagem central nas modernas buscas do Graal, que para mudar, já não é chamado “Santo Graal”, mas
“Sangreal”, ou seja, sangue real. 

A revelação desse segredo remete-nos aos evangelhos gnósticos como a Pistis Sophia e O evangelho de Maria, sobretudo para mostrar que
Maria Madalena era a bem-amada do Mestre Jesus, o Cristo.

Chegamos, assim, a um terreno delicado e não menos perigoso caso não tenhamos nenhuma idéia do processo que se desenvolve dentro de nós e à nossa volta. 

Há uma profunda sabedoria que ensina que a união do homem e da mulher pode não apenas ser um símbolo, mas a chave efetiva de uma idéia espiritual superior. Em particular o casamento, a união de Jesus e Maria Madalena, deve realizar-se necessariamente a fim de conduzir toda a humanidade aos mistérios libertadores, o que está em flagrante contradição com os ensinamentos da Igreja de Roma. 

Este é o saber secreto transmitido de geração a geração por fraternidades secretas.

Nas escolas de mistérios, pelo contrário, o casamento sagrado representa a união alquímica que todo ser humano deve realizar interiormente: a união de seus aspectos masculino e feminino, anulando assim toda idéia de separação. 

O Espírito divino e a alma humana devem unir-se conforme a descrição
profunda dada por Johann Valentin Andreæ em sua obra prima "As núpcias alquímicas de Christian Rosenkreuz".

Segundo O Evangelho de Maria, Maria Madalena é a “companheira de Jesus”, isto é, a nova alma que, libertada das realidades transitórias daqui de baixo, vive em união íntima com o Espírito, seu esposo, personificado
por Jesus. 

Raramente os thrillers religiosos transmitem a compreensão de que o
segredo do Graal, o casamento sagrado do novo ser humano, não pode se realizar no plano evolutivo da natureza comum. 

De fato, essa realização supõe o despertar interior da natureza divina do homem, o que não é possível se os impulsos do sangue, fatores de extremado egocentrismo humano, não tiverem sido totalmente neutralizados, deixando assim de causar qualquer interferência.

Essa é a diferença crucial da idéia freqüentemente evocada de uma união carnal entre Jesus e Maria, que teria dado origem a uma pretensa descendência real que se perpetuaria até nossos dias.

Nos mistérios cristãos libertadores, o “velho homem”, cada um de nós, começa morrendo na cruz deste mundo antes de ressuscitar como novo homem. 

Essa verdade gnóstica crucial transforma-se em falsa verdade histórica quando fala ao homem de nosso tempo e ele permanece surdo, ou quer permanecer surdo, à exigência incontornável de se transformar e se entrega às suas fantasias.

Dizemo-lo sem rodeios: não é possível participar desse mistério sem estar preparado para renunciar a si mesmo e a todas as ilusões. 

Não existe nenhuma linhagem real que conceda a realeza interior através do nascimento. 

O inverso é a verdade: somente o renascimento interior dá a realeza do Espírito.

E neste caso cada ser humano torna-se, ele mesmo, um rei-sacerdote, o herdeiro do Graal. É unicamente dessa maneira que a misteriosa sabedoria se revela.

“O mesmo Espírito testifica com o nosso espírito que somos filhos de Deus. E se nós somos filhos, somos logo herdeiros também, herdeiros de Deus e co-herdeiros de Cristo, se é certo que com ele padecemos,para que também com ele sejamos glorificados.” (Rm 8:16-17).

O mistério do Graal dormita nas profundezas inconscientes da memória coletiva da humanidade. Ele está no coração da sabedoria que se oculta nas lendas do Graal, histórias romantizadas e thrillers religiosos atuais.

Se percebermos isso e liberarmos em nós a sabedoria oculta, compreenderemos a grande renovação espiritual à qual assistimos atualmente, e como ela se expressa por numerosas criações culturais suscetíveis de tocar os buscadores, embora em forma banalizada, deformada e profanada. 

Mas, ali onde muitos ainda têm necessidade de códigos e de chaves quiméricas, o verdadeiro buscador do Graal perde a ilusão de poder alcançar a realidade no plano exterior. 

Ele está consciente de que o que lhe é apresentado de modo tão sensacional apenas o desvia de sua busca para o saber interior. 

Ele não se põe em busca das pegadas de um rei-libertador ou de um de seus sucessores capaz de salvar a humanidade graças a sua herança sanguínea.

Com base na consciência recém-nascida, ele sabe que o futuro nascimento do filho real se realiza no próprio ser humano. 

As forças-luzes libertadoras atuam no sangue de todos os que a ela são receptivos. 

Esse é o passaporte obrigatório, e não a predestinação pela nobreza do sangue herdado de uma família ilustre, supostamente a do Graal.

Nesse processo, os criminosos que aparecem nos romances em questão representam os adversários no próprio ser. 

São forças opostas que intervêm a fim de impedir qualquer elevação espiritual, qualquer ligação com as forças superiores, qualquer renascimento na Luz. 

A nova orientação da alma representa a própria taça do Graal na qual o alimento espiritual puro é recebido.

Essa é a verdadeira sabedoria oculta. 

Ela não se encontra em parte alguma senão nas profundezas do próprio coração. 

Não se trata, portanto, de um manuscrito amarelado retirado de uma cripta subterrânea nem de um tesouro escondido no altar de uma antiga igreja. 

Quando o coração se torna receptivo à sabedoria que não está fora de
nós, porém em nosso interior, os véus que pendem diante do coração são afastados. 

Ao buscador simplesmente curioso ela permanece inacessível e velada, como aos fariseus que possuem a chave do reino de Deus, mas não se servem dela nem a dão aos outros (Evangelho Gnóstico de Tomé). 

Quem permanece silencioso interiormente será encontrado pela verdade e encontrará a verdade. 

E a verdade, a sabedoria oculta, lhe retirará os véus dos olhos, abrirá sua vista e se manifestará a ele, nua e sem rodeios. 

“Graças te dou, ó Pai, Senhor do céu e da terra, que ocultaste estas
coisas aos sábios e instruídos e as revelaste aos pequeninos” (Mt 11:25).

Após tal revelação, o verdadeiro buscador do Graal vende ao primeiro alfarrabista todos os seus romances adornados com explorações imaginárias, pois eles já não são necessários.

Ele descobriu e compreendeu a mensagem velada, e passa a escrever a história de sua própria vida: a total entrega de seu ser interior ao novo homem, que é o prólogo e o fim, passado e futuro, o verdadeiro
personagem central desse verdadeiro thriller que ele está agora em vias de viver. 

Ele é o vencedor no combate que conduz pessoalmente entre o bem e o mal, entre a Luz e as trevas. 

É ele que nos faz fechar definitivamente as páginas da antiga existência e abre o livro da nova vida. 

quinta-feira, 15 de março de 2012

Felicidade e Sofrimento


A felicidade é uma necessidade básica. No entanto, todos, com certeza, já perceberam que os momentos de felicidade são efêmeros.

Como gostaríamos que fosse diferente!

Se olharmos para o mundo, veremos que a felicidade não é duradoura em nenhum lugar e que em toda a parte o sofrimento se prolonga; e como os irmãos se matam uns aos outros, combatendo com atrocidade!

A primeira metade do século XX, tão profundamente “esclarecido”, cerca de 70 milhões de homens foram mortos, em guerras horríveis. O abuso do poder e a violência que dele decorre derramaram sobre a humanidade uma onda ininterrupta de sofrimentos assustadores.

Conflitos interiores e exteriores não pararam de fazer crescer o medo e o desespero.

Para tentar explicar a situação, muitos afirmam com convicção que o sofrimento é necessário e até mesmo que ele tem um certo valor na vida. 

Participar do sofrimento dos outros é ter compaixão e quem sofre considera que isto é um sinal de Deus que está olhando por ele.

Se nos aprofundarmos neste grande mistério e estudarmos as emoções do coração humano, descobriremos que existem duas espécies de felicidade e de sofrimento. 

Há o sofrimento causado pela crueldade, pelas crises e pela injustiça deste mundo, e pela incapacidade de enfrentá-las de maneira correta. 

Por outro lado, existe a felicidade causada pelos sentimentos de segurança e de simpatia, a felicidade que nasce das relações entre os seres humanos e que acaba tornando-se a finalidade da vida.

Este tipo de felicidade e de sofrimento pertence aos processos da vida terrestre e somente diz respeito à dimensão natural do homem mortal, a seus desejos e necessidades.

Também há um sofrimento e uma alegria que provêm de uma outra fonte, que provêm da ignorância ou da consciência da presença de um princípio de eternidade dentro de nossos corações.

Quem capta e sente um pouco estas forças de eternidade, sente uma alegria intensa e ao mesmo tempo um grande sofrimento.

Estas vivências podem acontecer com regularidade e tomar conta de todo o ser, para sempre. 

E isto acontece cada vez que o comportamento se aproxima de Deus ou se afasta dele. 

Esta experiência pode ser traduzida pelo profundo sofrimento de sentir-se separado da vida divina original. 

Mas também há a alegria que volta cada vez que se pode ouvir o apelo da eternidade em meio à solidão, à crueldade e à futilidade do mundo.

A felicidade e o sofrimento terrestres são a própria expressão da vida natural sobre a terra. 

A felicidade e o sofrimento que resultam de nos colocarmos em harmonia com o princípio interior do Espírito divino fazem entrever uma nova possibilidade de vida: uma vida que haverá de desabrochar a partir do princípio imortal do Espírito dentro de nosso
coração.

Considerados deste ângulo, felicidade e sofrimento passam a ter um novo valor, que será como uma oportunidade a ser alcançada, uma tarefa a ser cumprida, e principalmente como uma promessa.

Se continuarmos prisioneiros do sofrimento ao qual a humanidade está submetida desde a sua origem, acabaremo-nos esgotando e abandonando a luta, arrastados para sempre no círculo vicioso onde não é possível haver vitória no combate: a luta pela felicidade e a luta contra o sofrimento não chegam a nenhum resultado positivo.

Todos os que vêem (os despertos) claramente adquirem uma compreensão totalmente nova e vêem as coisas sob uma nova luz. 

Quem julgava seu sofrimento exclusivamente em função dos critérios terrestres, agora está certo de que o ser humano sempre
tem tendência a renegar o princípio divino dentro dele e que por isto torna-se presa fácil do sofrimento.

Finalmente, ele reconhece que existe dentro si um princípio divino e o coloca à frente de tudo para que ele possa viver e crescer. 

Então, ele descobre que muitos sofrimentos vão-se enfraquecendo e até mesmo podem ser evitados, graças a sua atitude totalmente diferente em relação à vida. 

Ele já não experimenta o sofrimento como um flagelo, mas como um auxílio e uma graça no caminho de sua vida. 

São como degraus pelos quais ele deve subir até o mundo divino, o mundo da Verdadeira felicidade.

Por que ele tem de subir estes degraus?

Para adquirir cada vez mais compreensão, constatando que todos os sofrimentos são causados pelo egocentrismo, e que o eu deve retirar-se pouco a pouco e morrer a fim de que o Homem original ressuscite.

Assim, cada vitória sobre o eu, fazendo-nos sofrer e cair de nosso pedestal, nos eleva também cada vez mais rumo à eternidade. 

Quando compreendemos e sentimos o sofrimento, ele é aceito, e é sem hesitação que subimos os degraus um a um para, enfim, nos perdermos na felicidade divina