terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

OS VERSOS ÁUREOS DE PITÁGORAS



Mestre Pitágoras viveu há dois mil e quinhentos anos, numa colônia grega conhecida hoje pelo nome de Sicília. Com frequência ele é citado de um só fôlego com Hermes, Zoroastro e Platão, e é incluído entre os maiores sábios. 

É dele que nos vem a palavra filosofia: amor à sabedoria. Em sua opinião, o homem deve, primeiro, esforçar-se para alcançar a pureza da alma. Isso seria algo natural, se o homem respeitasse tudo o que vive, se refletisse acerca do universo onde reinam a regularidade e a harmonia e onde miríades de coisas crescem e se expandem naturalmente em seu próprio ritmo. Nesse macrocosmo majestoso,
o número, o valor dos números e suas relações determinam tudo o que se manifesta.

De acordo com a lenda, Pitágoras podia estar em muitos lugares ao mesmo tempo. Metaforicamente, também é possível afirmar isso nos dias de hoje, pois sua influência se faz sentir em toda parte: na filosofia, na ética, na astronomia, na
música e na matemática. A combinação entre música e astronomia pode ser observada na expressão “a música das esferas”.

Nesse contexto, Shakespeare também dá sua contribuição em O mercador de Veneza: 

“Vem aqui, Jéssica, vê como a abóbada celeste está incrustada de pontos de ouro que cintilam. Cada corpo celeste que vês, por pequeno que seja, segue
sua órbita cantando como um anjo no coro dos sempre jovens querubins. Assim a harmonia ressoa nas almas tornadas imortais. Mas, enquanto estivermos revestidos de argila, ela permanecerá inaudível para nós”.

Os pitagóricos formavam comunidades com determinadas regras de vida, as quais, para nós, se apresentam fora de seu próprio contexto. Segundo Dicaiarcos, Pitágoras afirmava que a alma é imortal. 

Tudo o que ocorre reaparece no curso da rotação do tempo e de acordo com determinados ciclos, e, por conseguinte, em verdade, nada é novo.

Tudo renasce com o que tinha antes ao seu redor, pois a vida decorre justamente em ligação com tudo o que a circunda. Homens e mulheres eram membros da escola pitagórica; todos os seus bens eram partilhados, e todos viviam em comunidade.

As descobertas nos domínios da música, da matemática ou da astrosofia eram consideradas como bens comuns e atribuídas, no sentido místico, a Pitágoras, mesmo após sua morte.

Os pitagóricos seguiam uma ética na qual a vida contemplativa ocupava o lugar principal: 

"Somos estrangeiros neste mundo; o corpo é o túmulo da alma. Mas não devemos fugir dele pelo suicídio, porque somos bens e propriedade de Deus, nosso pastor, e sem sua ordem não temos o direito de evadir-nos." 

Há três espécies de homens, exatamente como nos jogos olímpicos. A classe inferior é a dos que vêm comprar e vender, a seguinte, a dos competidores; e, acima de todos, os que simplesmente veem. 

A maior purificação é, portanto, a ciência desinteressada, e o homem que a ela mais se dedica, o verdadeiro filósofo, é quem mais se liberta da roda dos nascimentos”.

A palavra “teoria”, diz o filósofo moderno Bertrand Russel, é originalmente uma palavra “órfica”, isto é, um conceito proveniente de um antigo movimento religioso místico que considerava aalma como um elemento divino, tendo a possibilidade
de libertar-se do corpo após uma série de reencarnações. Poderíamos interpretar a palavra “teoria” como: uma “contemplação simpática e fervorosa”. Uma teoria pode levar a um saber científico ou a uma compreensão profunda. 

Assim, essa palavra, passando pelos pitagóricos e chegando até nossos dias, tomou progressivamente seu atual significado, mas para os que se deixam inspirar por Pitágoras ela conserva algo de uma manifestação extática.

Algumas das regras de vida dos pitagóricos foram transmitidas mediante Os versos áureos de Pitágoras.

Apresentamos aqui alguns fragmentos dessa antiga Sabedoria.

OS VERSOS ÁUREOS DE PITÁGORAS

Primeiro, honra os deuses imortais, como a lei estabelece, e venera o juramento, depois os heróis dignos de honra, e os gênios do mundo inferior, executando as prescrições da lei.

Honra também teus pais e parentes mais próximos; e, entre os outros, escolhe como amigo o melhor em virtude; cede às palavras doces e aos trabalhos úteis, e não te desavenhas com teu amigo por causa de pequena falta, tanto quanto
possas, pois o poder habita junto à necessidade.

Sabe que estas coisas, por um lado, são assim; por outro, habitua-te a dominá-las: sobretudo o estômago, o sono, e a sexualidade, e a ira; e nunca faças algo vergonhoso, quer com outros, quer sozinho; porém, acima de tudo respeita a ti mesmo.

Depois, sê justo em palavras e ações; habitua-te a nunca comportar-te sem refletir; porém, sabe que morrer é o destino de todos.

Quanto às riquezas, aceita por vezes adquiri-las, e por vezes perdê-las.

E tudo o que, pelos destinos divinos, os mortais recebem de dores, se disso tens tua parte fatal, suporta-a e não te indignes; porém é a cura que convém, tanto quanto te seja possível; e reflete desta maneira: que aos bons o destino não dá
muito desses sofrimentos.

Muitas palavras vis ou virtuosas são pronunciadas diante dos homens, que elas não te turbem; e não te permitas desviar-te por elas.

Se alguma mentira for dita, sê brando. O que te digo se cumpra em qualquer circunstância: Ninguém jamais deve levar-te, por palavras ou por ações, a fazer ou a dizer algo que não seja o melhor para ti.

Delibera antes da ação, para não haver consequências censuráveis: pois agir e falar sem reflexão são coisas de um homem fraco; mas cumpre essas coisas, a fim de que mais tarde não te entristeçam.

Nada faças que não entendas, porém aprende tudo o que te é necessário; e levarás assim a mais agradável vida. Também não negligencies a saúde do corpo;
porém, na bebida, na comida e na ginástica, sê comedido. Chamo medida tudo o que não te entristecerá.

Habitua-te a um modo de vida puro e sem indolência; e evita fazer tudo que cause inveja. Não gastes fora de medida, como o que ignora a beleza, nem sejas avarento: a medida em todas as coisas é excelência.

Faze o que não te prejudicará e reflete antes de agir.

Não permitas que o doce sono cerre teus olhos antes de teres examinado cada um de teus atos do dia: em que errei? O que fiz? O que não fiz que deveria ter feito?
Começando no primeiro ponto, vai até o fim e em seguida: se cometeste coisas vergonhosas, repreende-te; mas, se agiste bem, regozija-te.

Nessas coisas esforça-te e exercita-te; é preciso que as ames. Elas levar-te-ão aos caminhos da virtude divina; sim, por aquele que deu a tétrada à nossa alma, fonte
da natureza eterna! Agora empreende a tarefa, após orar aos deuses para que a realizem.

Quando tiveres dominado essas coisas, saberás qual é dos deuses imortais e dos homens mortais a constituição, e até que ponto se diferenciam e onde se unem.

E conhecerás, segundo a medida da justiça, que a natureza é em tudo semelhante, de modo que para ti não haja nenhuma esperança do que é sem
esperança, e que nada te permaneça oculto.

E saberás que os homens têm os males que eles mesmos escolheram. Infelizes, que não vêem os bens que estão próximos deles nem os escutam: raros são os que sabem livrar-se do mal.

Essa é a sina que extravia o espírito dos mortais; e, como cilindros que rolam, são jogados para lá e para cá e padecem males infinitos. Triste companheira,
a discórdia inata neles, sem que percebam, os extravia.

Não deves fazê-la avançar, porém cedendo a ela, dela fugir. Zeus pai, por certo livrarias de muitos males todos os homens, se lhes mostrasses de que demônio
eles se servem.

Tu, porém, arma-te de coragem, pois divina é a ascendência dos mortais, aos quais a natureza sagrada revela todas as coisas.

Quando algo dela tornar-se parte tua, dominarás o que te ordeno.

E, após teres curado a alma, salvá-la-ás desses males.

Abstém-te, porém, dos alimentos dos quais falamos, e, tanto nas purificações como na libertação da alma, decide e reflete sobre cada coisa, após ter estabelecido como condutor o juízo cheio de excelência que vem do alto; após abandonares o corpo, se chegares ao éter livre, serás imortal: um deus que não morre, já não um mortal.

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